A semana passou lenta demais para o novo casal de namorados. Mas o
final de semana chegou.
Conforme foi combinado, no Sábado seguinte à tarde Maurício
atravessou o lago assim que encerrou seu expediente no trabalho e se
arrumou em casa. Leandro já o esperava do outro lado em uma
charrete, e ambos seguiram para casa de Irene, onde Cecília o
esperava desde o começo da semana, toda impaciente.
Esse era o caminho mais conveniente a todos, porque o caminho que dá
a volta por sobre o espigão era muito comprido e a viagem se
tornaria mais cansativa e demorada. Viajando por lá, Maurício
chegaria mais tarde na Fazenda e por causa da distância deveria
retornar mais cedo também, permanecendo assim bem pouco tempo ao
lado de Cecília.
Buscar e levar Maurício até o barranco do lago foi a melhor opção.
E assim aconteceu por vários meses. Todo final de semana lá estava Maurício na casa de sua amada. Todos, tanto na casa do moço, como na casa da moça, aprovaram o namoro, apesar das diferenças tão distintas:
A moça vinha de uma clássica família de camponeses da região,
onde o avô e seus filhos eram muito respeitados e conhecidos. Eram
os donos de grandes extensões de terras e possuíam uma sólida
estrutura financeira, baseada na herança passada de pai para filho e
em toda riqueza que ela ainda produzia, apesar de a crise que por
aqueles tempos começou a tomar conta do país. O rapaz era
totalmente o oposto: tinha sua origem na mais humilde pobreza e viera
de um lar de famílias imigrantes, mudaram-se de São Paulo para
aquela cidadezinha mineira, sem possuir um palmo de terra. Eram,
afinal, “pessoas de fora”, como gostavam de alcunhar os
habitantes da região, pessoas sem qualquer tipo de raízes ou
vínculos com o lugar.
Mas o namoro prosseguia muito bem: Maurício fazia planos, Cecília
ouvia e concordava com ele.
Nas festas do Arraial o casal comparecia, sempre acompanhados dos
irmãos da moça – como era o costume da época. Nos feriados,
quando o tempo ocioso se tornava mais prolongado e poderiam passar
até mais que um dia na casa de Irene – que os recebia
maravilhosamente bem – às vezes Adriana atravessava o lago com seu
irmão, acompanhando-o. E os dois, sentados na charrete que Leandro
trazia para Maurício, seguiam até a casa de Cecília, que ao ver a
amiga chegar, não cabia em si de contentamento, louca para lhe
contar as novidades. Maurício transbordava de felicidade e simpatia.
Distribuía à sua volta todo aquele sentimento bom que dominava seu
coração. Durante esses meses o rapaz abriu seu coração,
transformando-se em uma pessoa mais comunicativa, o que, aliás, foi
uma surpresa para muitos que o conhecera nos tempos da Escola, pois
sempre tinha sido um menino tímido e arredio. Maurício agora,
desfrutava a plenitude da bem-aventurança.
Certo dia, quando estavam sentados no sofá da sala, observando a
tarde de um Sábado que já estava indo embora, Maurício disse a
Cecília:
__Amor, tempos atrás subi a montanha com Leandro e de lá se vê uma
paisagem maravilhosa... Imagina se nós ao casarmos, pudéssemos
construir uma casinha lá no alto!
Cecília riu, dizendo:
__Oras, não é má ideia, porém o que se dá para fazer lá no
topo? A vista é maravilhosa, mas como plantar lavoura ou mesmo criar
o gado lá em cima? Não seria viável, mas a ideia é
interessante...
__Sim, querida. É apenas uma ideia. Viveríamos aqui mesmo, na parte
baixa, mas poderíamos subir lá, de vez em quando... Seria como
“casa de veraneio”, onde – tenho certeza – passaríamos
momentos maravilhosos...
__Hummm... momentos maravilhosos... O quê, por exemplo? – provocou
Cecília.
__Bom, talvez pudéssemos nos amar ao som dos pássaros e do vento,
enquanto olhamos através da janela toda a imensidão da Terra... –
foi a resposta de Maurício que nesse momento ficara rubro de
vergonha.
O rapaz tinha crescido num ambiente austero, onde seus pais lhe
ensinaram a moral, e Maurício foi um bom aprendiz. Respeitava sua
noiva, como se era de esperar naqueles tempos, e por tal motivo era
cada vez mais admirado por ela, que sempre esperara dele um porte
decente e elegante. Maurício se apaixonara perdidamente por Cecília,
e com seu jeito de ser, soubera apaixonar sua namorada também. Mas
também soubera namorar sem “avançar o sinal”, como se diz hoje
por aí...
Todavia, naquele dia Cecília estava pensativa, e com um ar de
insegurança, perguntou ao rapaz:
__Amor, você está morando em Acemira, e a gente só se vê aos
finais de semana... porém, você jura para mim que jamais vai se
iludir com as “coisas da cidade”, e será sempre meu? Hum?
Cecília sempre morou no sítio, porém, sabia muito bem que a vida
na cidade facilitava muitas coisas. A cidade – mesmo naquela época
– já era considerada um ambiente onde a moral e a honestidade
poderiam sair facilmente do controle... Já houve casos em que moços
da cidade mantinham namoro com duas, até três moças ao mesmo
tempo! E quando isso acontecia, a namoradinha da roça era sempre a
última a saber do caso! Namorar um “rapaz da cidade” sempre foi
um ato corajoso para as meninas da roça. O fato do namorado morar
longe de suas vistas – ainda que Acemira estivesse a menos de duas
léguas de distância – assustava e deixava Cecília insegura.
Maurício compreendeu imediatamente o teor da pergunta e assegurou:
__Sim, Cecília. Não há necessidade de juramentos, pois só tenho
olhos para você! Mas se isto te deixa mais tranquila, eu juro. Serei
sempre seu. O meu coração pertencerá sempre a você, e ninguém
mais desfrutará daquilo que lhe pertence, desde hoje e para sempre.
E é por isso que aguardo com impaciência o dia do nosso casamento!