Capítulo 18: "Felicidade"




Leandro trazia consigo os documentos, enquanto Adriana fechava as portas e janelas da Sede. Subiram o caminho até a porteira em silêncio, observando de longe o casal ao lado do cactus, conversando. Cecília virou-se para ver os dois que se aproximavam e Maurício acompanhou seu olhar. Sorriram todos, sem nada dizer sobre aquilo que não havia necessidade alguma de se falar: Pois estava bem claro, estampado no olhar de Maurício e Cecília!
Montaram todos em seus cavalos e principiaram a volta, que deveria ser bem rápida pois a casa de Irene ficava próxima, a quase uma légua da Sede. Caminho que poderia ser percorrido em cerca de meia hora.
Agora, o casal apaixonado estava na frente, cavalgaduras muito próximas, onde seguiam conversando em tom baixo, quase em murmúrios, sorrindo e olhando-se mutuamente, quase não se dando conta de que Leandro e Adriana vinham mais atrás, só observando o casal. Adriana sorria satisfeita e no olhar de Leandro percebia-se a aprovação. Sim! Se dependesse deles, o namoro de Cecília e Maurício poderia continuar, porque agradara a eles desde o começo. Seus pais certamente também aprovariam, pois sabiam o quanto o velho Getúlio apreciava a família de Alécio. O velho ficaria contente com tal notícia, se estivesse ainda vivo...

Em casa, Leandro convidou Maurício para subir o grande morro e observar de lá, onde existem aquelas pedras, toda extensão da Fazenda Águas Frias – convite que foi recebido não com muito entusiasmo, agora que o rapaz tinha em mente outras tarefas – como, por exemplo, se sentar ao lado da amada no sofá da sala e prosseguir a conversa que é tão necessária para que os dois se conheçam melhor... Todavia, Maurício sabia o quanto era importante a conversa de Cecília com seus pais em particular, pedindo-lhe a aprovação daquele namoro antes mesmo do rapaz se aproximar deles, e pedir pessoalmente. Queria Cecília ter certeza de que o rapaz seria bem-aceito, que tudo correria bem, e que o pedido de Maurício seria bem-sucedido. Pensando assim, Maurício aceitou o convite de Leandro.
O caminho foi percorrido em menos que duas horas, pois a trilha que levava até o topo era boa e os animais treinados. O orgulho de Leandro era mostrar aquelas ruínas no topo da montanha. Alguns se orgulham do seu gado, outros de sua lavoura, outros ainda se orgulham de seus animais de montaria... Leandro se orgulhava daquela obra tão interessante e misteriosa que estava nos termos da terra de seus pais.
Apesar da vasta leitura e dos conhecimentos de Maurício, o rapaz não soube precisar a data e nem a origem daquele monumento. Mas a vista daquele ponto era muito linda! Um verdadeiro mirante natural. Maurício observando aquela vista magnífica, imaginou nesse momento que um dia poderia fazer uma casa no topo daquele morro, para ali viver com Cecília!

Ao descer, tudo estava já preparado... Cecília sussurrou em seu ouvido: “coragem, pode lá falar com papai e mamãe. Já estão cientes de nós dois e vão aprovar seu pedido”
Foi o dia mais feliz da vida de Maurício. Sentia como se renascesse outra vez, mas dessa vez não como um bebê que não compreende o mundo que o cerca: Era como se renascesse plenamente consciente da boa sorte que o cercava e da felicidade que acompanha a vida dos bem-aventurados. O rapaz não se lembrava de nenhum dia antes deste, que tivesse sido tão feliz como agora! Tantas humilhações ele sofreu na Escola, tanta pobreza na família, tanto sofrimento por causa de Narciso, e o sonho frustrado de continuar seus estudos... e agora tudo se clarearia de uma vez na sua vida: Seria o homem mais feliz do mundo, pois finalmente poderia viver feliz e em paz, ao lado de sua amada.
Após o pedido de Maurício e a aprovação dos pais de Cecília, o rapaz consumiu as poucas horas que restaram daquele dia sentando-se na sala ao lado da moça, em namoro, enquanto Adriana, os pais e irmãos de Cecília confabulavam numa conversa informal na grande cozinha, onde Irene preparou outro café após o jantar.
No dia seguinte precisavam partir. Mas a volta seria diferente da vinda...
Quando chegaram à Fazenda, Maurício tinha certas dúvidas e muita ansiedade. Mas agora, o rapaz voltava para sua casa com o coração mais leve, repleto de felicidade e amor.
Após o almoço, (onde as duas crianças – irmãos mais novos de Cecília – não paravam de olhar, atentos ao novo casal, admirando e achando graça, pois nunca antes tinham visto Cecília com namorado!), Adriana e Maurício despediram-se da família, com direito de serem acompanhados até a porteira por Cecília, que seguia de mãos dadas com Maurício. Num último adeus, Adriana e Maurício montaram seus cavalos e partiram, enquanto Cecília recolhia-se à casa, toda sorridente...

No caminho de volta para casa Adriana observava seu irmão, que agora parecia outra pessoa! Falante e bem-humorado, Maurício transbordava de felicidade.
Aquela viagem nunca foi tão rápida! O entusiasmo preenchia o tempo, e a conversa animada entre os dois irmãos fez com que as horas passassem rapidamente.
E ficou assim combinado: Que sempre aos Sábados após o trabalho, Maurício atravessaria o lago de barco. Leandro o esperaria na outra margem, de charrete, trazendo-o até sua casa; e o levaria de volta na tarde de Domingo.







“Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói, e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer.”


“É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que se ganha em se perder.”


“É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.”


“Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?"


Luiz de Camões (1524-1580)